quarta-feira, 18 de julho de 2012

nas ilhas de são romão

Depois de todas estas declarações enfáticas de amor e devoção, que seria ela se o relacionamento terminasse, perguntou o homem do chapéu. Seria como os gatos vadios que vemos e vamos vendo por aí, respondeu-lhe rui enquanto acendia o sexto cigarro. Tudo se repete, deus nos livre.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

crónicas de um soldado apartado: terras viciosas

Negra consumação. Feiticeira. Olhos negros, da Guiné por serem negros, são gentios por não terem fé. Tetas de negra, de pau-brasil esculpidas, rijas e fortes, contra o meu tronco erigidas. Sexo quente, ávido e suculento. Banhado pela lua, teu corpo de cor parece prata. És delírio, negra.

domingo, 2 de outubro de 2011

cartas perdidas: ilha

César, minha ilha de amores imaginários. Minha terra de luz onde há pássaros a cantar nos campanários.Tens campos de milho a chegarem-te à porta de casa, e eu vejo onde te escondes. Esperas as cegonhas todas as primaveras, com mais amor do que esperas as minhas cartas. Às andorinhas reservas os teus nichos, maiores que o amor que para mim guardaste. Tua pele cheirava a rosmaninho e eu para ti era feito de alecrim.

Não podaste a macieira, e ela apodreceu.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Hipopótamo

Um dia quis escrever um livro. Estava a fumar um cigarro na minha varanda e a ter uma conversa comigo mesmo. Pensei no café que tomava e como era demasiado cremoso. na embalagem dizia aveludado, quando devia dizer cremoso. Pensei na pontuação e como não queria ter trabalho com isto. Pensei num titulo. Conversas com o meu cigarro. Conversas de cigarro. Monólogos do cigarro. Monólogos de cigarro. Tudo me parecia pretensioso e forçado. Da minha varanda, conseguia ver um bar de strip e os monólogos de cigarro passaram a monólogos despidos. Mas fiquei enjoado. E não subitamente enjoado. Se ficasse subitamente enjoado, já estaria a fazer demasiado esforço e este livro era suposto ser simples, como se as ideias surgissem e aparecessem no papel. Mas não apareciam no papel, eu teria que ligar o computador, abrir o processador de texto, escolher o tipo de letra, o alinhamento, o tamanho. A ideia estava a ficar demasiado mecânica. Voltei a pensar nas stripers. Monólogos despidos não fazia sentido. Comecei a pensar em sexo e ligações intimas e corpos suados e prazer e gritos e dor. Estava tudo a ficar muito porco. Havia muitos "e". Queria escrever sobre as ideias que tenho quando estou sozinho. Sobre esses pensamentos solitários, sem pensar muito neles. Lembrei-me que gosto de hipopótamos. Se calhar podia escrever um livro sobre hipopótamos, ou sobre o que eu penso deles. Eu gosto de hipopótamos. Acho que gostar das minhas ideias é como gostar de hipopótamos, quando começo a dizer isso muitas vezes, a ideia de gostar dessa ideias, ou dos hipopótamos, começa a soar estranha.

Se um dia escrever um livro vou lhe chamar hipopótamo. Sem nenhuma razão especial. Só porque gosto de hipopótamos.

domingo, 4 de setembro de 2011

mar de cinzas e cimento

É como se me matasses e eu morresse de novo.
Mas a maquina é suave.

Sê esmagado por elefantes de metal que fogem do meu mar salgado,
Vais ser sangue, suor e lágrimas uma vez só.

Vais voltar à terra de onde vieste com o rabo entre as pernas,
que nem cão vadio que és.

Vou ser sangue, lágrimas e sal.
Vou ser eu mais um morto.

Sê a dor e a droga que não devolves.
Vais querer o amor que não me querias dar.

Vai ser como se morresses de novo, só mais uma vez, bem devagar,
no meu mar salgado.

domingo, 17 de julho de 2011

Os teus lábios são os meus lábios. O teu corpo é o meu corpo.

Avançam sobre a relva com passos furtivos, se bem que com a segurança que lhes é devida, a de não serem perturbados. A corrente da alma escoa-se naquela direcção; não podem fazer outra coisa senão partir, deixando-me a sós. A escuridão envolveu-lhes os corpos; que canto estarei a ouvir; o do mocho, o do rouxinol, ou o da carriça?


Caiu um peso na noite, o que a fez afundar. As árvores parecem maiores devido a uma sombra que não é a que lhes está atrás. Ouço os ruídos que me chegam de um cidade cercada, quando os turcos estão esfomeados e de mau humor. Ouço-os gritar num tom agudo.


Tudo parece estar vivo. Esta noite não consigo ouvir morte em parte alguma.