quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

temo pela vida do meu semelhante

Eu não me importo se as tuas mãos estiverem frias, pelo menos ainda estou vivo, mesmo não tendo para onde ir. Mas por favor, não me deixes. Não me deixes aqui com este remédio. Mesmo à noite, não me deixes dormir sozinho, pois quando durmo é quando estou ainda mais só. E é ai que preciso que tomes conta de mim. Eu sei que também choras quando eu vou embora, mas peço-te que nunca mo digas, não conseguiria aguentá-lo sozinho. Tu és o único pilar que aguenta esta casa de lunáticos.
Vejo as luzes através do ecrã a criarem sombras, onde sinto os estofos a roubarem-me o corpo, todo o meu ser foge por um buraco no chão, feito pelo teu anel. Ouço as canções de embalar vindas das máquinas de escrever, que contam verdades que ninguém quer ouvir. Dizem que vais partir. Não me deixes sozinho com o meu irmão que tenho medo de o matar. Os ciúmes podem apoderar-se de mim e eu não quero mais sangue nas minhas mãos.
Estou com mais medo do que nunca.

Não me deixes. Não me deixes aqui com este remédio.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Lírios

Os contos que me contaste, não sei onde os guardaste.

Na relva fresca, fruto da terra húmida, uma rosa colheste. Adornaste o meu cabelo com ela, e um botão da minha camisa de tresmalhou. Tombei. O vento continuava adejando a copa das árvores, que se enchiam de flor. O rio continuava regando os lírios brancos, que na sua margem se alimentavam. Vénus lá se prostrava, rodeado de ninfas se enfeitando, e cantando aos amores. Soltei um grito que em mim desconhecia, e tornei-me senhora do meu corpo. Encheste-me de perfumes e óleos primaveris, essências fecundas da mãe do amor. Lavei-me no rio dos lírios brancos, qual deusa ajudada pelas ninfas, sendo mirada pelo seu Marte. Querubins e Serafins te limpavam o rosto, suado da refrega.

Os contos que me contaste, não sei onde os deixaste. Eu trago-os em mim, porque em mim os semeaste.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

o nascimento de narciso

eu escolho a metamorfose do ser, o rompimento, movimento,
o cair desbravado e levantar do chão.
eu escolho o grito, a luz, o mito do nascimento
para não cair nas tretas do sono.
eu escolho a memória para evitar o esquecimento.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

preludio ou sonho número quatro: a cabana de baba yaga

enquanto matava um galinha para beber o seu sangue, a velha anciã mostrou-me o mapa, encriptado em enigmas.

após a Jovem e a Mãe,
sou a Grande Sábia, a Velha Anciã
,
e digo-te a verdade que é uma só.
a césar o que é de césar
a deus o que lhe pertencera.

domingo, 31 de outubro de 2010

sonho número três: encontro na montanha do fogo

Após três dias perdido num floresta, segui um gato tão negro como a noite. Ele levou num à procura de uma estrada. (que comece então uma nova demanda).
Levou-me até uma estrada de terra batida. Ali, os dias não acabavam. Vi no céu uma chama com duas mulheres, uma com um manto vermelho, e uma menina com um coração em chamas na mão direita. A mulher mais velha e mais sábia disse-me para não fazer mais perguntas e apenas seguir a estrada, mesmo assim, descalço.

Até amanhã, disse-me.
Até amanhã se Deus quiser.
Hei-de querer, o meu coração está entre vós.

Eu sou a verdade
Eu sou o caminho.
Ninguém chegará ao azul sem mim.

Havia um homem enterrado, coberto de dúvidas dos seus crentes. Fora a sua mulher quem o matou - ou a sua filha -, com balas prateadas, como se mata outro qualquer. Dizem por aí que Ela gosta de destruir as vidas alheias, de homens perdidos que não sabem governar, mas quando já nada resta, tira a alma a esses pobres coitados.

Eu sou a verdade
Eu sou a escritura sagrada.
Sem mim não há azul, nem outro caminho.

Até amanhã se tu também o quiseres.
Acredito num só deus todo e poderoso.
Acreditas em mim, disse-me, e meu agora é o teu corpo e o teu peito.

sábado, 30 de outubro de 2010

cartas perdidas: a perfeição ilusória inacabada

Teremos que nos transfigurar para nos podermos amar. Teremos que nos aparecer a nós próprios enquanto outros seres, para que possamos construir nova história. Deitar fora todos os pergaminhos, e escrever tudo de novo.
Desta vez, viveremos como deuses, afastados da mesquinhez do pensamento e do trato humano. Seremos harmonia com as flores, com o canto das aves e com o crepitar da fonte. Seremos a água que dela jorra, e onde o soldado se vai refrescar. Não seremos nem mais, nem menos, daquilo que devemos ser. Existiremos como uma unidade cósmica, que deambula pela natureza, e que se renova sem cessar.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

poemas nocturnos #1: hoje.

hoje.

sou apenas o retrato de um homem.

sou apenas uma mala de senhora.
sou a tua colagem do sétimo ano.
sou o teu espelho no outono.

sou um homem sozinho na rua.
e com dois cigarros no bolso
procuro a sobriedade.

não quero negligenciar o nosso amor.
quero que os teus gatos gostem de mim.

nunca escolho os lados, nunca escolho entre os dois,
pois só te quero, só quero a ti.

domingo, 19 de setembro de 2010

o meu gato tem insónias III

Abre meus olhos, meu amor
E verei o dia!
Visitação do sol, oh luz.
Ilumina a vida.
Guia-me pela mão, sê a lâmpada dos meus pés
Que em tudo vacilam.

À fonte vou que é minha cruz,
Vou levar meus olhos.
De lá caminha o meu amor,
De lá vem o troar da trompa.
Venha o Sol! Venha o Azul!
E comece o Mundo!

sábado, 18 de setembro de 2010

sonho número dois: alice

Esta distância cada vez mais me perturba. Custa-me que ainda ninguém perceba que tu está bem, assim como eu estou bem. Mas se ousar dizer que sei que tudo que eles dizem sobre ti é mentira, mandam-me para junto de ti. Como as paredes devem ser mais altas e mais apertadas. Sempre me imaginei como tu, presa, num tubinho de papel, sendo uma moeda a subir pelas paredes. Os casacos brancos com os quais eles te prendem, não servem mais que para te prender das mãos, para te impedirem de ver que ainda consegues controlar os teus sonhos. É isso que eles nos querem fazer, querem nos impedir de sonhar, de poder sonhar. Como eu sinto a tua falta.

Sempre que não atendes as chamadas, penso que encontraram os corpos.

domingo, 12 de setembro de 2010

o meu gato tem insónias II

Tenho medo. As paredes tornaram-se negras e espessas. As divisões comprimem-se, apertando o ar, e eu asfixio. Estou tonto. Dentro delas aparecem cadáveres; crânios que gritam. Som estridente, suspenso e ensurdecedor. Relembram os erros do ser, que de humano tem pouco. Estou enjoado. Há um palhaço triste dentro de casa.

Sei que pela hora em que o portão chiou, foi a última vez que me amaste com o teu olhar. Era madrugada, e já um de nós havia morrido. Toda a música era o canto do corvo.

Socorri-me do branco pó que um dia me ofereceste. O que existirá depois do azul?

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

o meu gato tem insónias

Porque choras em silêncio, pobre mulher?
Porque fazes da tua vida o trabalhar incessante nesse tear?
Quem te sujeitou a tal sorte?
Por que linhas te coses?
Qual o fio da tua vida?
Se o amarrares, reconhecê-lo-ás?
De onde vem ele, e para onde vai?
Com quem se entrelaça?
Julgas, assim, tecer o teu próprio destino?
Pobre mulher, porque choras em silêncio?

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

universo

Encontremo-nos, então. E que, desta vez, seja para sempre. Que pertença à eternidade o nosso abraço. Que esteja confiado às mãos do "para sempre" o beijo que te dou. Que a aurora jamais se transforme em dia claro. Que o crepúsculo não ceda à noite, e esta nos venha envolver com o seu negro manto. Ou que aconteça tudo isto, e não nos apercebamos, suspensos que estamos, num espaço que só nós respiramos.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

the wolves at my door

you're the wolves at my door.

How can I love someone like her? (someone that loves me back)

all my life I've tried to find someone that would laught at my jokes. when I think about it, I'd rather have someone that cries with the same songs. how can I know if things are worth it if I can't let you smile? these dreams, I can't make sense of. I need you to tell me it's ok. can I love somebody else? can you cry with another man? can she betray me like you did?

today I found a new door. you would love that. I'll never find another woman that likes to gaze at the stars like you do.

you're still at my door.
(and these dreams don't make sense either)

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

crónicas de um soldado apartado: Maria, seu lar em ruína

Trouxeram-me os algozes a noticia, e à beira-rio me plantei. Por ti não verti lágrima alguma, e o rio continuou o seu curso. Cantei, para ti, o canto da terra, da força criadora, quando fraca me encontrava. Triste, lento, embalado. Mergulhei o meu braço na água. Depois o tronco. Flutuei. Tornei-me parte do leito do rio, na esperança de que lá, onde o olhar perde a vista, te encontrar. Mar de sal que te matou. Lembra-te do meu nome, Maria, quando deres o óbolo ao barqueiro. Que embarquemos os dois, já mortos, para o que há-de vir.

domingo, 8 de agosto de 2010

Skinny Love

Estou novamente de viagem, parto de comboio tendo-te como destino. Contudo, não sei para onde parto, não sei quem tu és. Só tenho esta viagem, onde espero encontrar-me. O cansaço bate e, por entre pensamentos vazios, vejo-me, exposto. A claridade, lá fora, preenche os espaços que me deixaste, sempre esta ignorante procura de inspiração.

Aqui, enquanto não consigo escrever, sofro - não é por ti que sofro, mas por mim -, pois deixaste-me nesta ridícula condição. Sou mais um fado desencontrado, mais um amante prometido. Sou eu quem te quer ter como meta. Hoje sei que quando chegar à estação vou ter que perceber que a corrida foi ontem, e foi outro quem te ganhou.
Faz-me um favor: fecha os olhos e lembra-te das tuas viagens. Diz-me agora o que vês. Consegues ver os campos verdejantes à tua frente? Consegues sentir o vento a bater-te nas pernas? Ou pelo menos lembrar o cheiro da rapariga de olhos azuis que costuma sentar-se ao teu lado? Eu não me lembro de quando beijei a tua boca pela primeira vez. Eu já nem me lembro se alguma vez beijei a tua boca. Lembro-me dos teus Marlboro amaçados e da tua mala castanha de viagem. Como era a tua voz? Costumavas gaguejar antes de dizeres que me amavas? Apenas sei que sorrias quando te acordava com um beijo. Não me lembro se tinhas olhos azuis ou verdes. Talvez verdes. Mas adorava ver os teus pés morenos a baloiçar ao vento.
Agora sei que tens outro homem e és feliz, mas não sei se alguma vez eu fui teu. Se fui, apenas foi por teres pena de mim. E compreendo isso. Eu amava-te demais. Demais para estar contigo. (Suponho que nunca vás perceber o que isso é).

A minha estação está próxima. Não sei que mais te dizer.
Não te consigo tirar da cabeça.
(Talvez até encontrar alguém novo)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

cartas perdidas: post scriptum

(nós nunca nos despegamos dos que não existem quando estamos sozinhos.)

está a ser difícil não pensar. está a ser difícil não imaginar. Está a ser difícil não ser eu. mas desta vez vai dar certo. desta vez vou conseguir. desta vez não vou falhar.

não me quero agarrar a uma ideia. a uma imagem. a uma expectativa. é tudo tão vago, que torna o risco ainda maior. se eu só funciono no plano abstracto e se fujo do concreto a passos largos, desta vez isso deixa-me inseguro. e com isso não sei funcionar. que estupidez tudo isto. que raio de objecções aleatórias. merda.

talvez tenhamos mais aventuras loucas e selvagens, talvez não, mas daqui para a frente, não serei eu a inventá-las.

quero andar de cavalo. quero tomar um café envenenado. quero passar por entre vidros. quero ver tudo azul e formigas a voarem.

ainda estás ai?
ainda estás?
...ai?

eu sempre estive aqui. moro dentro da tua objectiva e cubro-me com a tua película.



é preciso esquecer tudo
tudo pode ser esquecido

sexta-feira, 30 de julho de 2010

(sem) abrigo

Fiquei horas a olhar para o vazio,
Mas ele nada me respondeu.
No escuro perfilaram-se os teus traços,
Mas o teu rosto não apareceu.
Finalmente adormeci,
E no meu sonho te ouvi,
E o meu mundo estremeceu.
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Perdoa-me a débil escrita, mas a mão que segura esta pena está fraca. Não é a mesma que outrora te acariciava o rosto, e te afagava no meu regaço.

terça-feira, 27 de julho de 2010

campanhã, porto, 2007

Em Dezembro, bebendo black russians, ouvi-te falar das tuas angústias.

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Não importa para onde parte este comboio, desde que estejas comigo.

(In)finito

Uma vez li uma frase de um escritor francês do qual não me lembro do nome, o homem dissipa a sua angústia inventando ou adaptando desgraças imaginárias. Nunca percebi o seu significado, simplesmente sempre achei que era algo bonito para dizer em alturas de pouca inspiração. Como hoje. Mas hoje nem há angústia. Apenas o vazio. E foi neste vazio que encontrei a solução para uma antiga questão, onde posso encontrar o homem perfeito. Numa fase inicial, procurei-o nas ruas, em velhos escritos, em retratos sujos a preto e branco, até dentro de mim. Nada, não encontrei nada.

Sempre tive este estranho vício de criar pessoas mais trágicas que eu, ainda mais falhadas, traídas pelo destino, tal como eu. Até o dia em que conheci o homem que sempre quis criar, eloquente, atraente, sério e talentoso. Ali estava ele, com vinte anos, loiro, de olhos castanhos, mais profundos que o mar e mais quente que o sol. O sorriso dele, era perfeito, sincero. Ele era quem eu queria ser, mas ninguém é quem queria ser. Tentei prendê-lo às minhas folhas mas não consegui. (ainda bem que alguém o prendeu aos seus braços). Ele se calhar não é o homem perfeito, mas sei que é um bom homem. Espero sempre ver aquele brilho no olhar.

Se um dia ele passar pelo mesmo caminho que eu, que encontre um rapaz de rosto rosado que lhe solte um sorriso.
o homem dissipa a sua angústia inventando ou adaptando desgraças imaginárias, disse Raymond Queneau, mas talvez seja mais fácil, por vezes, dissipar as angústias inventando histórias de amor, como as que eu vos quero escrever.

(és sortudo por o teres, e ele a ti)

sábado, 24 de julho de 2010

abrigo

Construí um abrigo para só nós existirmos. E onde só nós existimos.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

crónicas de um soldado apartado: cárcere

Escravo me fizeram os meus inimigos. Beberam do nosso vinho, e fuderam as nossas mulheres. Agora remamos rumo a suas terras, terras malditas que tanto cobiçamos, que serão nossa prisão doravante. Cárcere maldita. Vomito as minhas entranhas e o fel que me deram para sustento do corpo, que a alma, essa, insustentável está. Esfiou-se em farrapos. Cheira a merda, e a podridão e a fome e a morte. As feridas do chicote com que nos incitam escorrem seu sangue para meio da imundice. Preferia morrer, Maria. A morte a isto.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

cartas perdidas: maria ou inês

Ontem falei com a tua irmã. Parece que está tudo bem. Já não há motivo pelo qual nos preocuparmos.
Também reparei que mudaste de nome. Já ninguém te trata como eu tratava. Agora tens um marido. Já não precisas de te sentir especial. Já não precisas de algo só nosso. Muito provavelmente já existe algo só vosso.
Mudaste de nome, já não precisas de mim,


Eu era o teu verme e tu a minha rainha, agora não sou mais que um parasita que te vê ao longe.

terça-feira, 13 de julho de 2010

sonho número um: as (des)aventuras da minha alma

Perdi a minha alma, pois também perdi a minha Inês.

Acabei de sair do barco, procuro rumo, um oriente que me oriente, quero pôr os pés na terra e encontrar o teu abraço. Só me recordo dos recortes do teu rosto, de como o teu sorriso brilhava mais que todas as luzes, tornando a tua face a mais bela das minhas pinturas. Vejo o barco da morte à minha frente, envergada por almas perdidas fazendo um mar. A morte, esta da letra pequena, carrega a sua companheira que nunca esqueceu e sente o peso de tudo que tem que encontrar. Esta cruz pesa mais que uma outra que diz carregar a paz do mundo. Esta carrega os horrores de todos os homens, leva os sonhos a pesadelos e faz adultos das crianças. Perante esta cruz todos isão guais, não são mais que os próximos a levar esta barcaça. Mas ainda não é a minha vez, tenho que seguir e encontrar-te. Desvio-me e ouço cães uivar. Sentem o meu cheiro. Estão cada vez mais próximos e querem levar-me com eles. Do meu estômago sem fios de luz que escorregam como serpentes. A minha alma escapa-me à medida que vou andar. O cães estão cada vez mais próximos, são como fumo, negro e de olhos com safiras. Tentam agarrar-me mas já estou próximo de tua casa. Vou esperar aqui, debaixo deste candeeiro que não me responde. Levanto as mãos e acendo-o. A sua luz azul aquece-me.
Vejo-te a sair do prédio. Pedes que te siga. Sigo.

Vejo safiras ao longe, por entre o nevoeiro, e o rio que sangrei.

terça-feira, 29 de junho de 2010

crónicas de um soldado apartado: aurora

Corria uma brisa fresca, e o rumor das copas das árvores indiciava que a batalha estaria para breve. Já reunido ao batalhão, fitava, atónito, caras anónimas. Jovens. Inocentes. Aquele além não terá mais que 14 anos. A armadura sobeja-lhe no corpo, e é para ele antes um fardo difícil de carregar, ao invés de ser a sua segunda pele, mais rija; tampouco consegue envergar simultaneamente a espada e o escudo. Pobre mãe. Pobre filho. Roubou o reino a inocência àquelas lânguidas feições, àqueles pálidos olhos. Onde estarão os heróis de guerra? Ter-se-ão quedado no meio da peleja? Mas que meio?, se batalhas a serem travadas sempre houve; onde o início? Onde o fim? Soldados em desgraça… terão caído do seu cavalo, trespassados por uma ignóbil lança. E suas marias, que pensarão? Esperarão até ao fim dos seus dias, crentes de que o seu soldado, o seu homem, o seu amante, voltará cavalgando, vitorioso? Chorarão, quando se lhes chegar a maldita notícia? Chorarão, que todas as lágrimas ainda não foram choradas. Assim são as mulheres, choram na mesma proporção que amam. Por ora descansarei. Ao rumor das árvores, juntou-se agora o rufar dos tambores. Em mim, apenas minha alma se agita. O rapaz chora.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Re: Stacks

Já fazia algum tempo que não pensava em ti. Até que um dia, por culpa do meu fatal destino, ouvi a música que me lembrou de quem tu eras. Passei dias a pensar em ti, a tentar trazer o teu rosto para perto dos meus olhos. O cinema juntou-nos. Olhaste-me através da pelicula, por detrás de fumo e luzes. Ali, estavamos sozinhos outra vez. Só eu e tu na imensa escuridão, tão obscuros e trágicos como sempre gostei. Quando vi o teu nome na tela, chorei.
Ali, senti saudades de tudo que não vivemos.

(Skinny Love)

segunda-feira, 21 de junho de 2010

cartas perdidas: cruz das tormentas

Matem-me.
Tirem-me deste tormento
Que é meu sofrimento
No qual eu nado e me afogo
Lentamente...
Esta cruz que me persegue
E que não consigo afugentar
Persegue-me mesmo
Sem precisar de me procurar.
Eu trago-a em mim,
E de lá não a consigo tirar.
Porque tens que me massacrar?
Desaparece.
Deixa-me em paz.
Tu que transformas a minha vida fugaz
Na pior das mortes
Lenta e vagarosa
E preguiçosa em chegar.
Pára de me importunar...
Porque tudo me parece
uma cabala em que tudo se transforma:
Os segundos em horas
As horas em semanas
As semanas em anos
E os anos em vidas.
Passadas e esquecidas
Que procuram regressar.
Espero por ti há tempo demais...
Porque prolongas essa demora?
Se eu só quero desaparecer,
Porque insistes em me fazer viver?

segunda-feira, 14 de junho de 2010

crónicas de um soldado apartado: Maria, seu lar

Maria trouxe-me água e afagou-me no seu regaço. Meu cavalo, fiel companheiro que me trouxe de volta ao conforto do lar, bebia nessa fonte de vida eterna que são as águas do leito do rio. O colo branco de Maria, com o seu perfume a jasmim, revigorou-me. Sua essência voltara a correr-me nas veias. Oh minha amada de todas as horas, porque me amas tu de coração na mão, por cada vez que parto? Tola mulher, esperas que até ao fim dos tempos retorne a casa, nem sempre são, mas a salvo? Sou cobarde e preciso de ti. Isso, tira-me a armadura que pesa a este escasso corpo. Sim, sara minhas feridas com teus mil cuidados. Faz-me teu, que em breve partirei. Amo-te e necessito-te, mas tenho um dever para com meu famigerado rei.

(100) dias de inverno

Custa-me ver-te falar sobre as coisas que não sabes.
Custa-me ouvir a tua voz mesmo quando não ouço o que dizes.
Custa-me olhar para a tua cara, mesmo sabendo que já me deixou feliz.
Custa-me pensar na tua presença sem imaginar a tua ausência.
Mas, pior que tudo isto, custa-me escrever isto sabendo que é para ti.
Gostava de ter uma forma de te contar todos os meus segredos que não te posso contar e assim ignorar tudo que me irrita em ti.

domingo, 13 de junho de 2010

cartas perdidas: a ira de césar

Como ousas tu, Almada, depois deste tempo todo, dizer que eu te fiz cativo? Acreditas mesmo que sou eu que te prendo? Tu és quem não quer ir embora. Culpas-me por todos os teus fracassos, dizes-me que sou o motivo para todas as tuas derrotas. És tu quem não quer ser mais homem do que o homem que és hoje. Eu abri-te a porta, permiti que deixasses entrar outras pessoas, contudo fazias com que eu ainda quisesse beber do teu café envenenado. E eu sempre sorri, sem saber quem bebia.

Tu sempre gostaste de me lembrar da minha condição ridícula e do meu engenho mediocre. Invejo-te, não pela pessoa, mas pelo acto. Eu, ao contrario de ti, sempre te invejei pela pessoa, pela pessoa que eras, pela pessoa que amei e sempre respeitei. Mas tu, fazias sempre por insultar a nossa amizade, sujavas o meu nome, arrastavas o meu corpo pela lama, e fazias das minhas lagrimas motivo de gargalhada. No inicio também me ri, enganado, coitado...

Almada, tanta é a minha raiva e desprezo por ti, que o meu amor não me permite escrever uma boa carta.


quinta-feira, 10 de junho de 2010

cartas perdidas: febre adormecida

Fotografaste-me, e despiste-me. Puseste a cru todas as minhas fraquezas, e os meus vícios, e as minhas solidões, e as minhas angústias. Acto vil, o teu. Roubaste-me a alma, e perpetuaste-a nesse pedaço inerte de papel.
"Poesia", dizias tu. Sempre amei mais a prosa e o seu discurso directo, sem floreados de talha dourada.
Guardaste-a para ti, e prendeste-me a ti. Sou teu cativo.
Egoísta, porque de ti não tenho mais do que uma vaga lembrança.
Liberta-me.

domingo, 6 de junho de 2010

carta biografica de um peixe que pensa em amar

Desde sempre me fora imensamente difícil falar sobre as minhas amizades, em vários sentidos. Apenas sobre Almada conseguia escrever sem sentir um pequeno nojo assim que pegava na caneta. Talvez seja por causa das cartas, as nossas cartas, que começaram a tornar-se mais importantes que os nossos encontros. Decidi expô-lo e, assim, a mim também. Em cada carta falava de um aspecto diferente da minha vida ou da sua, mas quando chegou o momento de lhe falar sobre uma nova amizade que nutria, não consegui escrever. Enquanto a minha voz se calava, a minha caneta começava a secar.

Agora, já uns anos depois, consigo falar graças a uma caneta nova, mas não a Almada.

Durante uma semana dei abrigo a um jovem estudante de medicina de apenas dezoito anos. Eu deveria ter cerca de vinte e cinco na altura, não estou certo. Se não era essa a minha idade, sinto que as minhas atitudes e comportamento em relação a ele remetem para esse periodo da vida, onde já não somos adolescentes, somos adultos, mas ainda temos os mesmos dilemas, mas com um pouco mais de dinheiro no bolso.
Nos primeiros dias, convivemos como colegas de quarto que fazem por se evitar. Ele mostrava-se agradecido pelo meu gesto altruista e eu sentia-me bem por ser um bom samaritano. Desde o inicio achei interessante o seu fascinio por mim, vi como ele me admirava, como secretamente sonhava ser como eu. Ele costumava espreitar enquanto eu tomava banho. Nunca me incomodou, gostava de agradar-me de todas as maneiras, tentava ao maximo que eu ficasse satisfeito. Em troca, eu dava-lhe bastante de mim, talvez demasiado. Tentei ensinar-lhe o maior numero de coisas possiveis. Ele sempre se mostrou disponivel a aprender. Sempre quis saber mais.
Eu adorava acordar com o cheiro a café pela manhã. Fazia-me lembrar outros tempos, também eles agradaveis, mas nos quais eu me sentia completo.
Quando ele finalmente arranjou casa, não me senti assim tão sozinho, apenas que tinha perdido algo de mim. E realmente perdi, a minha juventude, ele levou consigo um colar que me pertencia desde sempre, que marcou quem eu era. Talvez só o deixei fazer isso porque ele lembrava-me eu há muito tempo atrás. Antes de muitas estradas e macieiras no Outono.

Ali, sozinho na minha sala, lembrei-me de quanto sentia a falta de Almada. Ele uma vez disse-me, Vivi num estado onde nem ousam entrar. Flutuei. Planei acima, intocável. Vivi a vida de um outro eu. Mudei assim, segundo as tuas teorias malucas do universo. Com a pequena diferença de que me apercebi. Agora dói. Porém sou agora eu quem diz, Vivi num estado por entre celuloide e milagres em fotogramas. Flutuei. Planei acima, intocável. Vivi a vida de um outro eu. Mudei assim, segundo as tuas teorias malucas dos amores e dos romances. Com a pequena diferença de que não consegui separar de mim, nem de ti. Agora dói. Mais que nunca.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

crónicas de um soldado apartado

Congeminei-te nas minhas entranhas. Eis-te agora, sozinho, para o mundo. Cavaleiro.


Estão despojados a meu lado a minha espada e o meu escudo. Despiram-me as minhas vestes, e agora enfrento o mundo deitado numa cama, envergando nada mais do que uma humilhante túnica. Abandonaram-me às sortes, e não sou mais do que um enfermo. Apodreço neste local quente e húmido e fétido, onde até o mais desprezável insecto zomba de mim, planando acima da minha moribunda condição. Pela Pátria lutei. Pela Pátria me feri. Lutarei novamente por ela quando uma nova guerra, no horizonte surgir. Que o amor é coisa visceral que, como uma lança, nos fere em pleno campo de batalha.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

eu beijo-te com os olhos, que não são meus nem teus

quando César viu Almada, segundo o primeiro.

Num final de tarde de primavera, César estava sentado numa simples mesa de café, com o seu cigarro e um livro,"O Amor nos Tempos de Cólera", numa versão bem antiga e já gasta. Esperava uma amiga que já não via há algum tempo. Era daquelas pessoas cuja existência era questionável, ele por vezes não sabia se ela não seria apenas uma figura da sua imaginação, como tantas outras, que habitaram e ainda habitam a sua cabeça. Quando ela entrou, transformou-se numa memória esfumada, que se desfazia com os raios de sol, pois os olhos de César apenas viam o homem que a acompanhava. Era Almada Zarco, viria ele a saber. Um jovem soldado que a amava a pátria e o seu cavalo. O seu corpo tinha uma leve luz vinda de trás que deixara o outro maravilhado. “Almada, César. César, Almada”. As apresentações foram feitas e os cafés foram bebidos. César reparou no peculiar ritual de beber café que o Almada praticara. Mexia o café, lambia a colher, e voltava a pousá-la. Secretamente, César sorriu.

A sua amiga, cujo nome e existência não tem importância para a história senão para ilustrar de forma coerente o encontro entre estes dois homens, tinha que ir embora, deixando assim, por momentos, César e Almada sozinhos no café sem muito que conversar, a não ser aquele livro que estava pousado na mesa. Mas mesmo assim não arriscaram entrar numa conversa que podia nunca mais acabar.

Almada tinha que sair, tinha que ir para a estação de comboio, de onde partiria para um local que nunca César soube qual era. Este fez-lhe companhia, fumando, sorrindo, um pouco envergonhado. Os seus olhos abraçavam aquela imagem para sempre, e ainda abraçam. Um homem, com o inverno aos ombros a ser abraçado pelo verão.

Chegados à estação, César tenta apanhar tudo que consegue num só olhar: a luz, as pessoas, o movimento, os cheiros. Almada olhou para a sua figura maravilhada com a vida, e soltou uma gargalhada. Meio embaraçado, antes que Almada entrasse no comboio, pediu se lhe podia tirar uma fotografia. Assim o fez, e assim disse adeus. Os seus olhos abraçavam aquela imagem e beijava-a com uns olhos que não era seus, nem dele.

chávena de café e um beijo em rodapé

quando Almada viu César, segundo o primeiro.


Almada viu César pela primeira vez, sentado numa esplanada de um café, numa tarde outonal. O recorte do vermelho das árvores, pintalgado pelo laranja fim de tarde do céu. Vestia castanho, e Almada não repararia nele caso este não envergasse um curioso cachimbo de cor azul eléctrico. Examinava-o com curiosa atenção. Depois, acendeu-o e fumou-o, como se tal fosse seu hábito desde sempre, e nele encontrasse indelével prazer.

O pitoresco quadro que diante dos seus olhos acabara de ser pintado, obrigou Almada a deter-se na beira da estrada mais tempo do que aquele que juraria ter estado a contemplar. Porém, não foi com surpresa que reagiu, quando o sujeito que fitava lhe ergueu a mão, em sinal de cumprimento. Era Almada, na verdade, quem estava a ser contemplado.

Desarmado, avançou tremulamente por entre as caixas de metal que expeliam fumo, e que nos últimos anos vinham invadindo a cidade. Almada odiava-as. Agravam diariamente, com seus excrementos tóxicos, a sua débil condição. Porém, hoje, socorria-se delas. De tudo o que servisse para retardar aquele encontro. Almada não entendia o porquê, mas temia aquela enigmática figura, tão banal como qualquer homem. Tremia.

-“Almada”.

-“César”.

Pediu um café. César acompanhou-o. Sem trocarem palavras, comunicavam. Mediam-se. Viam-se. Como era seu hábito, Almada lambeu delicadamente a colher no canto da boca, depois de mexer o café. Uma vez pousada a colher, César pegou nela, mexeu o seu próprio café e imitou o gesto.

Ali, naquele momento, algo foi selado. Uma gaivota, em voo raso, piou.

sábado, 15 de maio de 2010

cartas perdidas: o bucólico

Roubaste-me a idade, e fizeste-me só teu. Agora deixaste-me sair da tua penumbra. Eis-me aqui.


A rapariga tem os cabelos loiros, dourados pelo sol, quais campos de trigo ululando ao vento. Ele é mais novo e de aspecto franzino. Vieram a correr do lado do regato, e em frente ao meu alpendre se deixaram ficar. No desenrolar da conversa ela levanta-se e estende-lhe a mão, convidando-o a dançar. Os corpos deles juntam-se, e o rapaz ruboresce. Embalam numa dança trôpega, mas graciosa. Ela faz os possíveis para o ensinar, mas ele está mais preocupado em não parecer nervoso.

Depois deste quadro, meu caro César, a saudade de ti aumentou. Quantas vezes não acertamos o nosso ritmo, e por isso nos pisamos. Se nos fosse permitido ser criança novamente…

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Junkies



Por entre reflexos e sorrisos, olha para nós, como se fosses um de nós.
Senta-te à mesa connosco, fuma um dos nossos cigarros, tenta perceber os nossos vícios e manias.






Esta noite serviu? Já sabes porque sorrimos?
Sente o sol da manhã na nossa cama, vê como te ardem os olhos e saboreia o cheiro do café.







Vive na nossa escuridão, vive na nossa luz.
Não te esqueças das sombras, das mentiras do cinema, nem das verdades da poesia.
Lembra-te do beijo quente de uma mulher e do abraço forte de um homem, como todos nós o fazemos.


fotografias de João Cruz

quarta-feira, 5 de maio de 2010

cartas perdidas: a despedida

Desta vez falaste-me da forma que eu menos esperava até então. Tão longe de mim enviaste-me uma carta. Nela, Almada, dizias

Vivi num estado onde nem ousam entrar. Flutuei. Planei acima, intocável. Vivi a vida de um outro eu. Mudei assim, segundo as tuas teorias malucas do universo. Com a pequena diferença de que me apercebi.
Agora dói.

Novamente, como em muitas dolentes noites em que a chuva bate, solitário, invoco Garcia Lorca, que tanto amavas.

Eu pronuncio teu nome,
nesta noite escura,
e teu nome me soa
mais distante que nunca.
Mais distante que todas as estrelas
e mais dolente que a mansa chuva.

Amar-te-ei como então
alguma vez? Que culpa
tem meu coração?
Se a névoa se esfuma,
que outra paixão me espera?
Será tranquila e pura?
Se meus dedos pudessem
desfolhar a lua!

Eu pronuncio o teu nome na noite e isso dói mais que nunca.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

sem título #3

Eu não sei da beleza nem da arte
Não sei de homero nem das pessoas
Não vi a lua, nem sonho com marte
Ainda temo os pássaros e as lagoas
Mas, se soubesse dos cantos, faria das palavras a mais bela canção de amor.

Eu já não conheço a alegria nem a dor
Nos pés tenho as marcas do sol
Nas mãos tenho romances por contar
Nos olhos, números por saber
E na mente, dias por lembrar
Mas, se soubesse escrever, cantava-te uma canção de amor.

sábado, 17 de abril de 2010

cartas perdidas: o cativo

O meu querido amigo Almada - por quem guardo os mais simpáticos e respeitosos sentimentos e dirigo muitos dos meus escritos - tinha, e ainda tem, por hábito enviar-me algumas cartas com palavras que provavelmente nem ele entende. Obviamente, quando se fala de amor, poucos são os que conseguem.

Ele não se rege pelas nossas regras.
Nada sabe do sentimento alheio.
O teu amor perturba-o.
Odeia ver-te escravo dele.
Ele vive numa busca desesperada de vale em vale,
à procura de amar quem não o ama.
E sofre com isso.
E vive nisso.
E odeia-se por isso.
Ele não se rege pelas nossas regras.


Hoje sou eu quem diz com toda a certeza, O amor é um jogo, do qual as regras ninguém nos ensinou.



Continuamos a perder

sexta-feira, 9 de abril de 2010

cartas perdidas: o meu livro amigo

Na minha estante tinha uma edição antiga de "O Amor nos Tempos de Cólera". Na ultima pagina tinha escrito:

Quando se acaba de ler um livro, fica-se-nos um vazio. Como se um amigo com quem por longos periodos partilhamos segredos, vivencias e ensinamentos tivesse partido para parte incerta.

A., totally

Sim, tinhas razão. A minha estante está cheia de amigos que já partiram.

cartas perdidas

Hoje encontrei algumas cartas antigas, minhas e tuas, que te roubei, que me devolveste, que nunca te enviei, onde te menti e disse verdades a mais.
Ainda não sei por onde começar.

domingo, 28 de março de 2010

os coríntios

O Amor é paciente, é benigno; o Amor não é invejoso, não trata com leviandade, não se ensoberbece, não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal, não folga com a injustiça, mas folga com a verdade. Tudo tolera, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O Amor nunca falha.


maps and letters

He wrote me a letter. It was like this:

You should never try to understand me. I'm too much complicated for that.
Love you, anyway.

I tried to reply. I wrote him a letter, but I never sent it.

There was a girl who met a nice guy. They got along on the first date. She was trying to forget a man, a man that made her cry. But this nice guy made her laugh. And she liked him for that. But, one day, without a proper goodbye, she left him. He made her laugh, but he couldn't make her cry.

Wait, don't leave. They don't love you like I love you.

Always the love. Always and never.

quinta-feira, 25 de março de 2010

Flume

É fácil olhar para trás, e encontrar, entre tumultos e gritos que nunca foram entendidos, momentos que fazem as pessoas sorrir além das suas trivialidades. Cada toque, cada gesto, cada palavra tem o poder de transcender do seu estado e tornar outro dia qualquer no dia em que algo aconteceu. Toda a gente se lembra da primeira vez que beijou a sua cara metade, ou a primeira vez que disse as palavras que todos anseiam dizer. Todos os casais têm o café no qual se conheceram, o amigo que os apresentou, ou até mesmo a sua música. Eu tenho uma música, que é minha, mas também é tua.
Hoje, enquanto observava as paisagens que a viagem de comboio me oferecia, ouvia a minha música. Lembrei-me de ti. Sem qualquer motivo, lembrei-me de ti. Por momentos, pensei que as lágrimas me fossem escapar por detrás dos óculos de sol. Via o sol a por-se, com o céu completamente cor de laranja, tudo era agradável. Apercebi-me que tudo isto - todas as músicas que apertam o coração, todos os por-do-sol que fazem sorrir sem motivos ou todas as viagens que me fazem querer viver mais - recalca-me por não te ter comigo. Nem uma discussão, nem um abraço, nem um grito, nem um beijo. De ti não há nada, pois também nunca quiseste dar algo que fosse teu. Cheguei a pensar que podia vir a ser feliz contigo, e fico triste por nunca ter tido a chance para ver que estava errado. Eu tinha uma música, que era tua, mas apenas eu a ouvi.

terça-feira, 9 de março de 2010

quinta-feira, 4 de março de 2010

bipolaridades de um rapaz moreno

tu não percebes nada
eu sei que tu também ficas com sorrisinhos parvos quando falas com ele
tu provavelmente lembras-te dele em quase todas as musicas que ouves
eu sei o que isso é
e sei que ele também anda assim
mas se tu não fizeres nada, e se ele não fizer nada,
nada acontece
e no nada ficam.

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ainda ando eu aqui a perder o meu tempo.
a vida é tua,
a vida é dele,
a vida não é minha,
mais uma vez, a vida já não me pertence.
por isso, ama quem quiseres e fode quem te deixarem.

quarta-feira, 3 de março de 2010

o arco-íris tem um relógio que não morre

ainda ouço o tique-taque da tua gaveta.
os teus ponteiros sempre andavam para o lado errado e eu estava pelo caminho.

a chuva de fevereiro já não nos afecta. já não há holandeses bêbedos nem amantes escondido. nós já não somos esses amantes escondidos. eu encontrei um homem em mim, e tu encontraste um homem para ti. nunca estive tão perto de ti, sem te tocar, como estou agora. eu tocava-te à distancia, cada vez mais longe.

agora já há homem em ti. agora já há homem em mim.
agora sou eu quem é tocado e sente a distancia. nunca ninguém chegará onde tu chegaste.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Namorado Johnson’s Baby

A minha irmã hoje disse-me: Toda a gente gostava de ter um namorado Johnson’s Baby.

Eu, muito eloquentemente, questionei: Ah?

- Sim, um namorado Johnson’s Baby - insistia ela.

- Loiro de olhos azuis?

- Não. Que não faça chorar.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

a maçã do novo adão

Já passaram dois anos desde que partiste. Pouco mudou. Fico feliz por ver que a tua filha está saudável e que está feliz, apesar de tudo.

Uma vez perguntei-te, “Porquê”, e tu apenas respondeste, “Porque sabe bem”. Eu nunca pensei que me fosses dar uma resposta dessas, pensei que ias dizer que tinhas feito as escolhas erradas, que viste na heroína uma forma de escape, nunca pensei que fosse apenas por “saber bem”. “Uma vez, fui até um campo abandonado, num dia de verão, o sol estava no sítio certo, não estava muito calor, mas ainda estava agradável. Então consumi uma dose. Por momentos pensei que o mundo era só meu, que deus tinha criado aquele pequeno jardim do Éden só para mim, e a heroína era a minha maçã. Eu também trinquei essa maçã por causa duma mulher. Mas agora eu estou livre, e ela ainda anda agarrada”.

Infelizmente, essa maça deixou marcas. Pior que o vicio, foi o pressagio de morte que veio com ele. Uma doença que não mata, mas também não deixa viver. Tu pediste-me para nunca repetir o seu nome, e assim o farei. Quando vi o teu corpo, pensei que aquela não podia ser a pessoa que eu conheci em tempos. Tu eras bem-disposto, jovial, sorridente, mas ali estavas cinzento, frio, sozinho. Aprendi contigo que não devo ter vergonha pelo que sou, tal como tu não a tiveste, mas que não devo fazer dos meus erros, glorias, devo aprender com eles e querer ser melhor. E é também por ti – não só por mim – que eu quero ser melhor. Quero ter uma vida que me satisfaça tanto como a tua. Eu não estava à espera que partisses, nem mesmo quando te visitei no hospital. Se tu ainda tivesses a tua voz, certamente me dirias o que repetiste várias vezes durante a minha infância, “estás com essa cara porquê? Amanha já está sol outra vez”.

Para ti e por ti.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

a viagem

As letras fogem entre os acordes monossílabos da melancolia proveniente das vicissitudes triviais dum mero escritor e os beijos de uma borboleta que se faz humana para amar o olhar como a morte ama o violoncelista. A viagem parou e tudo se tornou real. O homem quis saber a minha validade e eu voltei a ver tudo direito. Mas depois cai e voltei a ouvir os violinos. A melodia ia crescendo e a borboleta começa a voar. Um homem com roupas de fada espalha a palavra, diz-nos que os nossos demónios, no final, são os nossos melhores amigos. Somos nós que não queremos ver que já estamos no nosso último acto. Fazemos banquetes para as despedidas, ilustramos a nossa dor, pintamos as nossas lágrimas, cantamos com vozes desgarradas sem pensar em falar amanhã. Aceitamos o fim do percurso. À medida que andamos, sentimos a partida já distante e vemos a meta apenas a dois passos. Assim esquecemo-nos da viagem, não aceitamos o azul, só procuramos o medo da explicação.

No final só perguntámos, Está bom para ti.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

o teu cheiro

Só há cerca de dois ou três meses é que me apercebi da importancia do cheiro, do cheiro das pessoas. Apercebi-me do cheiro do Alexander. Um dia, fui até sua casa e quando me sentei no seu sofá, vi um casaco de malha cinzento ali abandonado. Obviamente. reconheci que o casaco lhe pertencia. Lembro-me de o ver várias vezes com ele vestido, quantos são os retratos que tenho na minha mente e nas minhas fotografias. Não resistir a pegar nele. Juntei-o ao meu corpo, como se abraçasse o homem que o veste. Comecei a cheirá-lo e, num só segundo, mil imagens invadiram a minha mente. Inquieto, levantei-me pois vi que tinha entrado na sala. Olhei para trás e senti que ele estava comigo.